segunda-feira, 9 de maio de 2011

a melhor sondagem é a que não se publica



As sondagens de opinião são caras e são sempre pagas por alguém. Um jornal pode dizer que pagou e publicou uma sondagem objectiva, mas é importante descortinar aqui alguns aspectos da maior importância, quer do lado da procura, quer do lado da oferta.

Para começar, a própria independência dos media coloca-se hoje em questão, mais que noutros tempos. Cada jornalista vê a sua verdade condicionada quer pelo poder político, quer pelo poder económico (os media são empresas normais, com os seus interesses e preocupações próprios). É por isso importante saber quem pagou a sondagem que se publica.

Em segundo lugar, temos as empresas que fazem as sondagens, e cuja ética é posta à prova conforme o cliente e a encomenda. Quando um cliente quer conhecer melhor um problema, uma situação real, ou determinada percepção pública acerca de um assunto, encomenda uma sondagem a uma destas empresas. Estes resultados são delicados e muito raramente são tornados públicos, é uma informação demasiado valiosa para ser posta à disposição da concorrência (empresarial ou política). Estas são as sondagens mais rigorosas e acertadas, e são normalmente apenas para consumo interno da empresa. O problema é quando um cliente quer encomendar uma sondagem para ser divulgada publicamente. Aqui, o cliente quer mostrar os melhores resultados possíveis da sua posição, e a empresa de sondagens sabe disso. O cliente paga, por isso tem sempre razão. E um cliente satisfeito volta sempre onde foi bem tratado.

Como se manipula uma sondagem, então? Há várias maneiras. A maneira como uma pergunta é feita, por exemplo, pode afectar a resposta. Mas essa é uma forma demasiado óbvia, pois a pergunta tem de constar na publicação (um jornal, por exemplo) sem alterações. Então, o que normalmente se faz é um conjunto de perguntas prévias que “educam” o entrevistado para a resposta final. As perguntas prévias não costumam ser publicadas, apenas a última. Como influem, então, estas perguntas prévias na resposta final?

Imaginemos o caso de o cliente ser uma empresa com interesse na construção de uma central nuclear em Portugal. A pergunta final será publicada e é objectiva: “concorda ou não com a construção de centrais de energia nuclear em Portugal?”. Neste caso, as perguntas prévias vão ser feitas sobre energias limpas, baratas e amigas do ambiente.

Mas imaginemos agora que o cliente é uma empresa concorrente na área da energia, mas focada na transformação do petróleo e do carvão em energia. A pergunta que sairá nos jornais é a mesma, “concorda ou não com a construção de centrais de energia nuclear em Portugal?”, mas as percentagens alteram-se. Como a esta empresa não lhe interessa que a energia nuclear tenha apoio popular, faz uma série de perguntas prévias (não publicadas) sobre o perigo de haver desastres como os de Chernobyl e Fukushima, e fazendo alusões às bombas atómicas da II Guerra Mundial. Embora a pergunta final publicada seja a mesma, os resultados da sua resposta são muito diferentes.

A verdade da sondagem é condicional. Torna-se possível enganar sem mentir.

É por isto que as melhores sondagens são as que não são tornadas públicas, pois essas estão sujeitas a demasiados interesses e pressões para que possam ser levadas a sério.

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A propósito, as últimas sondagens sobre as eleições legislativas 2011:
- Aximage / Correio da Manhã
- Intercampus / Público / TVI
- Eurosondagem / SIC / Rádio Renascença
- Universidade Católica / Jornal de Notícias

Vale sempre a pena ler as fichas técnicas, para ver o que se mostra e o que ficou escondido.