terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

maquiavélicos casamenteiros

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Ontem estava a ver os Prós&Prós da RTP sobre os casamentos para homossexuais, e por várias vezes me lembrei de um antigo conspirador de outras freguesias: Nicolau Maquiavel. O florentino defendeu uma atitude diferente na vida política, onde o que interessa é desenvolver uma nova virtude que responda à verdade efectiva das coisas, e nada mais. Resumindo, Maquiavel sugeriu-nos que trocássemos o "dever ser" pelo "ser", baixando drasticamente o nosso horizonte, que antes se fixava na moralidade proposta pelos antigos que buscavam o Sumo Bem (o nosso Bem Comum é o descendente deste conceito), e que agora se devia concentrar no concreto do quotidiano, naquilo que realmente acontece na vida terrena - a tal verità effettuale que o autor destacava...
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Assim, Maquiavel criticou a virtude dos antigos, por nunca conseguir atingir plenamente o fugidio Sumo Bem, sendo esta virtude apenas ingenuamente boa. Era preciso uma nova virtù. Isabel Moreira, ontem a maquiavélica de serviço, fez exactamente o mesmo tipo de troça da "bondade" do Padre António Vaz Pinto, tendo ela sempre em riste aquele intolerante dedo, ao qual a adriana educação não terá porventura chegado.
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O abaixamento do horizonte moral que Maquivel quis trazer no início do século XVI é o mesmo princípio que alguns esquerdistas de hoje tentam concretizar até onde conseguem, sabendo que esta é uma luta sem fim, e inesgotável poço de votos. Querem fazer do Estado de Direito um Estado amoral, onde impera aquilo que é (e que simplesmente acontece) sobre aquilo que deve ser (e que é útil para a sociedade). Haverá sempre ladrões, mas catastrófico será o dia em que ser-se ladrão é legal. Sempre houve homossexuais, mas fracturante será para a família - e, consequentemente, para a sociedade - o dia em que eles se casarem.
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Esta questão decerto merecerá outros postais d'A Conspiração das Teorias, onde explicaremos melhor como os casamentos para homossexuais prejudicam sociedade e a família, que é a célula da primeira. Mas entretanto, ficamo-nos por esta: para continuarmos a poder dizer que o Estado é uma pessoa de bem, o Estado nunca poderá abdicar de ser moral.
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8 comentários:

MRB disse...

cá espero os futuros posts. Parabéns por este, gostei bastante:)

M. disse...

Querido António, do muito que já conversamos sobre isto, percebo-te.
Mas tenho a eterna pergunta: e o amor? Em que lugar colocamos o amor? ~
E se não houver homens nem mulheres,se houver apenas pessoas. Amamos pessoas, o que são, pelo que são, independentemente do seu genero.
Onde deixamos o amor numa sociedade que queremos pacifica e harmoniosa?
Beijinho grande meu querido

António Vieira da Cruz disse...

Obrigado Rosário. Cá espero também os teus comentários que sempre ajudam a perceber a verdade. Bjs

António Vieira da Cruz disse...

Maria, num simples comentário é impossível de te responder com toda a profundidade que a tua questão exige. Peço por isso que me deixes completar melhor num próximo postal. De qualquer forma, tentarei avançar aqui já algumas notas.

Há como sabes vários tipos de amor diferentes: o do pai por um filho, o do filho pela sua mãe, o de amigos, o do namorado pela sua namorada, o da mulher pelo marido, do irmão pelo irmão, o amor próprio, o amor a Deus, o amor por desconhecidos, e até por animais e por coisas... só para nomear alguns.

O filho e a mãe são pessoas que se amam... deve a sociedade permitir que se casem? E dois irmãos, que até são maiores de idade, porque não podem casar? Não podem. Não podem precisamente porque há limites que a sociedade impõe à liberdade de contrair casamento, e a meu ver com toda a razão de ser.

Não se trata de proibir o amor homossexual, que faz parte da esfera privada da pessoa, à qual chamamos privacidade, e onde o Estado não tem nada que intervir. O amor homossexual existe, é um facto, mas não se deve concretizar em casamento.

O casamento tem utilidade civil porque é o reconhecimento - e devia ser também o incentivo (facilidades a nível de impostos, etc.) - que damos a duas pessoas que em princípio vão contribuir para o crescimento e renovamento da espécie. Uma união de homossexuais é, à partida, estéril. Considero que não devem poder adoptar crianças - a adopção deve ser entendida no interesse da criança, e da sua educação para a vida. Na minha opinião, a inseminação artificial é também inaceitável do ponto de vista moral.

O casamento para homossexuais é um problema já por si complexo, e que traz consigo muitos mais problemas difíceis de resolver. Espero ter respondido a alguma coisa, e aguardo mais pistas que me dês.

Obrigado por teres posto a questão em termos de amor, penso que é o plano mais nobre da questão. Acho, contudo, que o amor homossexual não está em causa nem em perigo quando lhes vedamos o acesso ao casamento. A privacidade permite-o. A união de facto também. O conceito de casamento, o conceito de "casal", pressupõe diferentes géneros. Um "casal de gémeos" não são simplesmente 2 gémeos. São um rapaz e uma rapariga. O valor simbólico do casamento, e do conceito de família tradicional, é importante e útil que seja defendido na nossa sociedade, e por isso digo que o Estado não deve abdicar de ser moral. Liberdade sem valores, já dizia o nosso Tio Edmundo, é uma liberdade vazia de sentido.

Maria, muito obrigado. Um grande beijinho!

Madalena disse...

Este tema realmente por vezes deixa-me sem saber o que pensar. Mas essencialmente também penso que o que deve existir sim é a união de facto. Bom texto...

Alma peregrina disse...

Caro António Vieira da Cruz:

Magnífico post!!! Já tinha reflectido em vários âmbitos deste debate (sobretudo no âmbito da Lei Natural) mas nunca me apercebera desta necessidade de preservar um Estado moral.

De facto, herdamos de Machiavelli uma herança terrível. A de que o Estado não está sujeito a normas morais. Fruto disto foram as grandes ditaduras do séc. XX e a visão utilitária da vida humana que vigora na nossa democracia actual. Por que motivo continuamos a considerar (enquanto sociedade) os príncipes renascentistas como mais civilizados que os reis medievais é algo que nunca irei saber...




Gostaria apenas de complementar a sua magnífica resposta à Maria a quem (com a licença de todos) me dirijo:

Por que não amar "pessoas" em vez de amar apenas "homem" e "mulher"? Simples! Porque tal é impraticável!

Você está a dissecar o que não é dissecável. Toda e qualquer "pessoa" é um "homem" ou uma "mulher" (exceptuando-se casos raríssimos de hermafroditismo). Você não pode amar uma "pessoa" fora daquilo que ela "é".

É a mesma coisa que dizer: nós precisamos de "pessoas" a trabalhar nos nossos hospitais. Mas hoje em dia apenas lá trabalham médicos e enfermeiros. Já que aquilo que nós precisamos é de "pessoas", então qualquer um deveria poder trabalhar num hospital. Poderíamos pôr carpinteiros a prescrever antibióticos. Ou pôr engenheiros a fazer pensos.

A falácia aqui é que os "médicos" e "enfermeiros" são, já de si, "pessoas". Nós precisamos, de facto, de "pessoas" para trabalhar nos nossos hospitais. Mas mais do que "pessoas", precisamos que essas "pessoas" consigam exercer as funções que um hospital objectivamente necessita.

De igual modo, um "homem" e uma "mulher" são, já de si, "pessoas". O que é importante não é saber se no casamento há duas "pessoas" que se amam, mas se essas duas "pessoas" conseguem exercer as funções sociais que o casamento obriga. E isso, o António já justificou.



Completando os pontos do António, as línguas modernas são de uma pobreza franciscana no que diz respeito ao Amor. Só temos uma palavra para Amor. Os antigos gregos tinham várias, as quais serviam para designar os vários amores: eros, ágape, stautos, phylis, etc...

O nosso problema é que vivemos numa Civilização Ocidental com uma forte componente cultural judaico-cristã (a qual consagra ao Amor o pódio da coisa mais sagrada que existe), mas que se esqueceu que esta cultura judaico-cristão floresceu numa época em que se falava uma língua diferente.

Quando você fala em amar "pessoas", você está a referir-se ao Amor Ágape. Mas, quando você fala de "casamentos" homossexuais, você está a referir-se ao Amor Conjugal e ao Amor Eros.

O seu raciocínio é este:
1) Amar pessoas é bom.
2) As pessoas com tendências homossexuais amam pessoas (do mesmo sexo).
3) O Amor homossexual é bom.

Parece um raciocínio correcto, até que você susbtitui os conceitos pela terminologia correcta:

1) Amar pessoas é bom (Ágape)
2) As pessoas com tendências homossexuais amam pessoas (Amor Conjugal e/ou Eros)
3) O Amor homossexual é bom (Amor Conjugal e/ou Eros, NÃO Ágape)




Imagine um torneio de ténis de equipas mistas. Eu não posso participar no torneio fazendo equipa com outro homem. Mais do que admitir "pessoas", o torneio tem regras. Se eu pudesse inscrever-me com outro homem, já não se trataria de um torneio de ténis de equipas mistas. A função do torneio (e, consequentemente, a própria raison d'être do torneio) teria desaparecido.

Tal como não há torneios mistos onde não é exigida a participação de equipas mistas... também não há casamento onde não é exigida a união heterossexual. Um pato e uma pata são um casal de patos. Dois patos são isso mesmo: dois patos. Se considerarmos dois patos como um casal de patos, a própria existência da palavra "casal" deixa de fazer qualquer sentido (pois poderá passar a significar qualquer coisa).



Em última análise, a sua objecção oblitera por completo a polémica dos "casamentos" homossexuais. É que, se o que importa é amar "pessoas", então eu posso dizer a um gay: "Em vez de mudares a sociedade, procura uma mulher para amares, porque as mulheres também são pessoas".



Finalmente, lanço-lhe um desafio: por que você acha que o Estado iniciou a instituição "casamento"? Por que motivo, há 12.000 anos atrás, se começou a instituir esta união? Qual a função social do casamento para este ter um reconhecimento social? Não terá sido porque as pessoas compreenderam que esta era um união especial, diferente de todas as outras uniões e da qual toda a sociedade dependia?

Pax Christi

António Vieira da Cruz disse...

Cara Madalena, sê muito bem-vinda.
Obrigado pelo teu comentário, penso que estou contigo! Parabéns também pelo teu interessante blogue, que vou adicionar aos meus favoritos se não te importares.

António Vieira da Cruz disse...

Caro Alma Peregrina,

Obrigado pela visita e pelo grande comentário.

Há alguns meses que visito o teu blogue com alguma assiduidade, e começo a ver ali um "case study" de comunicação: para tão rica fundamentação, é muito fácil a sintonização com quem o lê depressa. Dou-te aqui os meus parabéns.

Do teu comentário aqui na conspiração, sublinho a referência aos quatro amores, muito oportuna, e essencial para percebermos que estamos a falar de alhos e bugalhos ao mesmo nível.

Um abraço